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OFICIAL DE JUSTIÇA- Os desafios de quem é o elo para a efetivação das decisões judiciais

“Longa Manus” é a denominação comumente aplicada ao Oficial de Justiça, por ele ser o executor das ordens judiciais, ou seja, “a mão estendida do juiz na rua”. Mas, essa proximidade e essa relação direta com o Judiciário e a população nem sempre significa tranquilidade. Pelo contrário, a rotina de um Oficial de Justiça não é das mais fáceis e, em alguns casos, chega a ser desafiadora, pois é seu dever fazer com que se cumpra a determinação da Justiça. 

Desde 2015, no dia 25 de março, comemora-se o Dia Nacional do Oficial de Justiça, instituído pela Lei nº 13.157/2015. A data foi escolhida por, em 25 de março de 1824, ter sido promulgada a primeira Constituição brasileira que mencionou em seu texto a existência desse profissional.

Quem nos conta um pouco desse desafio diário de trabalhar como Oficial de Justiça é Luis Cláudio, que atua há 26 anos na profissão e, atualmente, integra a Central de Mandados do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR), localizada no Fórum Criminal, no bairro Jardim Caranã.

Para ele, hoje são inúmeras as dificuldades diárias de um Oficial de Justiça para o exercício do seu dever de entregar e fazer cumprir os mandados expedidos pela Justiça. Mas, conta ele, nem sempre o risco está relacionado à natureza mandado e sim ao risco da exposição diária à violência social.

“O Oficial de Justiça trabalha na rua e longe da proteção física dos prédios do Judiciário e dos aparatos de segurança que sempre estão à disposição dos juízes e servidores cartorários. Trabalhamos de sol a sol, sem horário determinado, sendo rotina ser acordado nas madrugadas para atender ao chamado do plantão judicial. O Oficial de Justiça, normalmente, trabalha só e sem qualquer proteção da sua integridade física por parte do Judiciário. Se não existe força policial à disposição no tempo e na hora em que o cidadão comum precisa, o mesmo ocorre com a gente, porém o risco é inerente à função e nunca uma questão de escolha”, explica.

Luis Claudio afirma que, entre as diligências mais complexas e de maior risco estão a reintegração e emissão de posse, busca e apreensão de bens e menores, prisão e, a mais comum, o afastamento do agressor do lar conjugal nos casos de medidas protetivas nas ações que envolvem a Lei Maria da Penha.

“Apesar da periculosidade que envolve esse tipo de trabalho, os oficiais de justiça de Roraima não dispõem de quase nenhum aparato de segurança. Hoje, o único equipamento disponibilizado pelo TJ é de um colete à prova de balas. A gente precisa que o Tribunal de Justiça disponibilize uma segurança efetiva para os profissionais, inclusive com treinamento e capacitação para enfrentar determinadas situações”, alerta Luis Claudio, ao lembrar que em uma diligência há alguns anos, chegou a ficar preso dentro de uma residência onde foi entregar um mandado e teve que acionar a polícia para que pudesse ser libertado pela proprietária.

Luis Claudio conta ainda que um problema atual que a categoria enfrenta é o entendimento do Tribunal de Justiça de que, como a informatização de seus sistemas de atendimento existe uma demanda menor pelos serviços do Oficial de Justiça. Mas, ele contesta esse entendimento, pontuando que essa lógica não é real, pois quanto mais eficiente e célere é a justiça mais a sociedade acredita e mais demanda para resolução de suas lides.

“Realmente, para alguns tipos de mandados, em que os jurisdicionados podem ser notificados via telefone, esse processo foi facilitado. Mas, mandados de arrombamento, penhora, busca e apreensão, um sequestro ou arresto de bens, diligências mais complexas e mais evasivas, nunca podem ser executadas por um particular, ou seja, não podem ser terceirizados para o setor privado. Só um agente do Estado é capaz de cumprir. No caso, o Oficial de Justiça”, aponta Luis Cláudio.

E a questão da integridade física dos oficiais de Justiça não é o único problema enfrentado por esses profissionais. Atualmente, a categoria enfrenta uma grande defasagem de recursos humanos.

Hoje, são apenas 50 Oficiais de Justiça na ativa para atender todo o Estado. Desses, 36 estão lotados na Central de Mandados na Capital; 02 na Vara da Justiça Itinerante; 02 na segunda instância (Pleno e Câmara Única); 03 na Vara da Infância e Juventude; e os demais espalhados nas comarcas de Alto Alegre (01); Rorainópolis (02); Bonfim (01); São Luiz (01); Mucajai (01); e Caracaraí (01).

“Temos 15 cargos vagos e o último concurso foi realizado em 2011, oferecendo apenas duas vagas. A título de comparação, temos 10 desembargadores e 44 juízes. O ideal seria dois oficiais de Justiça para cada magistrado, portanto, 108 profissionais. São 54 magistrados que com o auxílio de mais de 700 servidores produzem decisões e mandados para serem cumpridos por apenas 50 Oficiais de Justiça. Ou seja, existe um grande gargalo gerado pela sobrecarga de trabalho”, explica Luis Claudio, lembrando que o processo não anda só e, para que haja celeridade, é necessário que o Oficial de Justiça dê cumprimento aos atos externos, pois se não houver intimação não tem audiência e o processo para, gerando prejuízos e frustração para o cidadão que tem direito a uma justiça célere e eficaz.

Para o presidente do Sindicato dos Oficiais de Justiça do Estado de Roraima (Sindojerr), Luiz Saraiva, os problemas não param por ai. Ele cita que o Oficial de Justiça é obrigado a colocar seu veículo particular a disposição do TJ e  para tanto recebe em contrapartida a Indenização de Transporte, que tem seu valor corroído a cada dia e está completamente defasado, carecendo urgentemente de correção. 

Para comprovar a defasagem, ele fez um levantamento do preço da gasolina comum em março de 2013, quando custava R$ 3,013, e março de 2023, ao preço de R$ 6.09, verificando um reajuste de 97,73%, sendo que a Indenização de Transporte foi reajustada em apenas 35,8%.

“Ou seja, perda real do poder de compra e de finalidade da indenização, que hoje não cobre os custos de disposição do veículo particular para execução do nosso trabalho e, muito menos, as demais despesas de manutenção do veículo”, lamenta.

O sindicalista aponta ainda outras perdas para a categoria, como o não reconhecimento de direitos previstos em lei (desindexação de benefícios); a ausência de isonomia entre carreiras com mesmas atribuições e responsabilidades; número excessivo de mandados causando sobrecarga de trabalho; plantões não remunerados; diárias com valores que não cobrem as despesas; além da redução de benefícios quando em afastamentos motivado por questões relacionadas ao trabalho.

“Tivemos uma reunião com a nova presidência do Tribunal de Justiça no dia 15 de fevereiro onde apresentamos as nossas reivindicações. Porém, passado mais de um mês, ainda estamos aguardando o cumprimento das promessas e o reconhecimento dos direitos requeridos, mas o diálogo continua e o Sindojerr continuará insistindo para uma solução pacífica e rápida, sem nunca desprezar o uso de alternativas mais contundentes de defesa dos nossos direitos”, finalizou Saraiva.

Sobre o Oficial de Justiça

A função do oficial de justiça como auxiliar da justiça perpassou vários períodos históricos, com registros desde os tempos bíblicos do Antigo Testamento.

No século XII, o território da Inglaterra medieval era percorrido por grupos de juízes itinerantes, de confiança do rei, que se ocupavam em resolver todas as espécies de processos nos quais interessavam politicamente. Todavia, antes da viagem dos juízes, um mandado (writ) era enviado ao sheriff local para que este convocasse, em determinado dia, os homens mais importantes da região.

Entretanto, foi a partir do processo de formação dos Estados nacionais modernos que o Oficial de Justiça adquiriu posição e funções mais definidas, de acordo com a especificidade de cada época e de cada sociedade.

No Brasil, a expressão “Oficial de Justiça” não mais traduz o nome do cargo público ocupado por este servidor, mas sim, a função pública ou especialidade por ele exercida no âmbito do Poder Judiciário da União, do Distrito Federal e dos Estados.

Em Roraima, O TJRR tem em seu quadro o cargo em extinção de Técnico Judiciário – especialidade Oficial de Justiça Avaliador, de nível médio, e o de Analista Judiciário – especialidade Oficial de Justiça Avaliador, de nível superior, privativo de bacharel em Direito